Inteligência Artificial como Fator de Desenvolvimento do Brasil: um debate na Escola Superior de Guerra

Inteligência Artificial como Fator de Desenvolvimento do Brasil: um debate na Escola Superior de Guerra

Na ultima quinta feira participamos como conferencista de Simpósio para o Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPEP da Escola Superior de Guerra (ESG).

Na ocasião abordamos com os Estagiários do Curso questões estratégicas e os efeitos da utilização da Inteligência Artificial como fator de desenvolvimento do Brasil.

E iniciamos a discussão com uma colocação básica: muitos executivos (e pessoas na sociedade de uma forma geral) acham o tema Inteligência Artificial (IA) intimidador.

As máquinas irão substituir os humanos? serão mais espertas do que nós? os robôs vão pegar o meu emprego? a inteligência artificial irá superar a inteligência humana?

São estas, dentre outras, as questões mais recorrentes que constatamos em recente pesquisa no Google sobre os temores predominantes na sociedade quando se fala em inteligência artificial, robôs e assuntos relacionados.

Em artigo anteriormente publicado já abordamos a questão: a aplicação de dispositivos eletrônicos cada vez mais potentes a diversas profissões, aumentando o potencial da descoberta e do uso do conhecimento no processo decisório e nas operações do dia a dia das empresas, mas gerando riscos decorrentes deste processo acelerado de transformação digital.

Tais preocupações tem sido manifestadas por autores como Martin Ford e em reportagens como a de Ricardo Abramovay: crescente autodeterminação das máquinas, desemprego, fim da privacidade e impactos no trabalho de muitos profissionais qualificados, notadamente naquelas funções que são, em algum nível, rotineiras e previsíveis.

Isto é, "à medida que as máquinas passarem a se encarregar desse trabalho rotineiro e previsível, os trabalhadores enfrentarão um desafio sem precedentes quando tentarem se adaptar: no passado a automação tendia a ser relativamente especializada e abalar um setor de emprego de cada vez, mas a situação hoje é muito diferente, a tecnologia é verdadeiramente generalizada e seu impacto também ocorrerá de forma generalizada", nos diz Martin Ford.

Como se colocar então diante da Inteligência Artificial? Autores como Nir Kaldero se colocam da seguinte forma perante o tema: "durante meus treinamentos de "ciência de dados para executivos"os participantes frequentemente se sentem excluídos quando confrontados com imagens de robôs e outras situações de aplicações de inteligência de máquina e dos sistemas inteligentes de aprendizagem no ambiente dos negócios".

Mas essa atitude "cabeça na areia" é um problema, nunca uma solução…há que se abraçar e entender, não temer e evitar, a revolução da inteligência artificial…ainda nos diz aquele autor. Nesta linha:

Em muitas organizações os quadros técnicos são frequentemente as pessoas encarregadas de promover as mudanças decorrentes do uso da inteligência artificial. Eles são certamente capazes de criar modelos de inteligência de máquina, mas a liderança do processo de mudança organizacional, operacional e cultural não está com eles.

Portanto, tal iniciativa deve começar como uma iniciativa "de cima para baixo". Os executivos ligados à estratégia e à condução dos processos de negócios são aqueles que devem traduzir os principais problemas de negócios em soluções por meio do uso das tecnologias da informação, dentre elas aquelas ligadas à inteligência artificial.

Uma das principais abordagens ligadas à criação de metodologias para orientar a democratização e a implementação das tecnologias de inteligência artificial nas empresas e na sociedade é o projeto da Google conhecido pelo acrônimo PAIR: The People + AI Research Initiative, uma iniciativa para melhorar a interação entre os humanos e os sistemas de inteligência artificial cada vez mais avançados.

O propósito do projeto PAIR é ajudar a situar adequadamente o uso da inteligência artificial como um meio de apoiar a resolução dos problemas dos negócios, de uma forma centrada nos seres humanos. Assim, busca-se ajudar às empresas e pesquisadores a responder a três questões essenciais:

Quais problemas dos usuários a Inteligência Artificial é especialmente adequada para resolver?

Como podemos aumentar a capacidade dos humanos adicionalmente à automação das tarefas?

Como assegurar que a Inteligência Artificial está sendo aplicada para otimizar as coisas certas (processos de decisão e operacionais)?

Outros caminhos para chegar a soluções semelhantes são modelos de modelagem de negócios como o Business Model Generation (CANVAS) para geração de valor em negócios e processos, assunto que já tratamos em artigo precedente no espaço deste blog.

Outras temas abordados em nossa palestra relacionaram-se às questões quanto à ética e à responsabilidade social no uso da inteligência artificial.

O recente caso da empresa Cambridge Analytica, e o efeito danoso sobre a sua reputação, deve ser vir de alerta para aqueles que ainda não se preocupam com a dimensão ética nas aplicações das tecnologias emergentes da informação.

A regulação das práticas associadas ao uso dos métodos e tecnologias relacionadas à ciência de dados, inteligência artificial e internet das coisas é outro ponto crucial nas discussões sobre as questões éticas.

Nesta linha, a Lei n. 13.709, de 14 de agosto de 2018, veio para regulamentar o tratamento de dados pessoais no Brasil, tanto pelo poder público quanto pela iniciativa privada.

Conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGDP), contém disposições que objetivam fortalecer a proteção da privacidade dos usuários e de seus dados pessoais.

Finalmente, cabe discutir as questões de responsabilidade social que devem ser assumidas pelas empresas e governos relacionadas às potenciais consequências do uso disseminado da inteligência artificial: preservação ou renovação dos postos de trabalho e desenvolvimento de políticas públicas para minimizar os efeitos do desemprego gerado pela tecnologia na sociedade.

Nos últimos anos vários países têm buscado meios para o desenvolvimento e a adoção de sistemas de inteligência artificial (IA), por meio da definição de estratégias nacionais, buscando equacionar investimentos e políticas públicas para o desenvolvimento e a adoção da inteligência artificial.

Estratégias, neste contexto, constituem um conjunto de políticas governamentais coordenadas, que têm um claro objetivo de maximizar os benefícios e minimizar os custos potenciais da aplicação da inteligência Artificial para a economia e a sociedade.

Um dos estudos mais relevantes recentemente publicado foi o Relatório das Estratégias Nacionais e Regionais sobre a Inteligência Artificial, a partir de pesquisa realizada pelo CIFAR, organização nomeada pelo governo canadense desde 2017 para liderar o desenvolvimento da estratégia nacional de inteligência artificial do Canadá.

Neste estudo é mostrado que algumas das estratégias são voltadas a posicionar os países como líderes globais no desenvolvimento e aplicação de inteligência artificial, enquanto outras contemplam metas mais modestas, de acordo com as prioridades políticas e as questões sociais relevantes na realidade de cada país.

O bloco mais avançado envolve dez países com objetivos e políticas estabelecidos, além de fundos de financiamento específicos, variando de U$ Austrália e Canadá (respectivamente U$ 21,6 milhões e U$ 95 milhões) a montantes bem mais elevados como China (U$ 2 bilhões), Coreia do Sul (U$ 1,95 bilhões), França (U$ 1,75 bilhões) e Comunidade Econômica Europeia (U$ 1,75 bilhões).

Outros 8 países contemplam documentos orientadores com objetivos estratégicos para a formulação e implementação de políticas futuras, ainda sem dotação de fundos específicos para os projetos, tais como Alemanha, Finlândia, India, Itália e Suécia. Em processo de desenvolvimento de estudos estão 12 países, como Austria, Estonia, Israel, Malásia Nova Zelândia e Polônia, dentre outros.

Cabe ainda salientar um quarto grupo de países que não têm uma estratégia nacional coordenada para a inteligência artificial, como os Estados Unidos e a Rússia, mas tem políticas implementadas, e são vistos amplamente como atores chave na "corrida global pela inteligência artificial".

Finalmente, são citados países como o Brasil e a Republica Checa, que possuem estratégias formais de transformação digital, sem no entanto focar em projetos ligados à inteligência artificial.

As estratégias nacionais apresentadas contemplam um amplo espectro de assuntos, classificados em 8 grupos principais: pesquisa científica, desenvolvimento de talentos em inteligência artificial, futuro do trabalho e do emprego, inserção das tecnologias nas indústrias e serviços, ética e transparência das ações, infra-estrutura de tecnologias e dados, aplicações no setor de governo e inclusão e bem estar social.

No contexto brasileiro as iniciativas são desenvolvidas em nível da academia, de projetos específicos apoiados em instituições de fomento como a FINEP, as Fundações Estaduais de Apoio à Pesquisa como FAPESP e FAPERJ, ecossistemas regionais como os de Santa Catarina e Pernambuco, iniciativas de associações como o CD&IA.Rio e o Advanced Institute for Artificial Intelligence em São Paulo, ou aplicações 4.0 diretamente financiadas pela indústria e pelo setor de serviços.

Concluindo, os temores predominantes na sociedade quando hoje se fala em inteligência artificial, robôs e assuntos relacionados, não diferem muito do que se discutiu no século passado.

A diferença é que, como falamos precedentemente, no passado a automação tendia a ser relativamente especializada, abalando um setor de emprego de cada vez e profissionais envolvidos em tarefas repetitivas.

A situação hoje é muito diferente. O impacto da tecnologia é verdadeiramente generalizado, já alcança os profissionais envolvidos com tarefas cognitivas e tem reflexos bastante ampliados no emprego. As empresas e governos, dessa forma, têm responsabilidade social ampliada quanto aos efeitos das suas aplicações na sociedade, na economia e nas pessoas.

E a preocupação já constatada dos países quanto à formulação de estratégias nacionais relacionadas nos mostra que, se não seguirmos esta linha de atuação, permaneceremos fora do contexto de competitividade e de protagonistas do desenvolvimento da inteligência artificial e outras tecnologias emergentes.

Fonte: https://medium.com/@fleurynewton/intelig%C3%AAncia-artificial-como-fator-de-desenvolvimento-do-brasil-um-debate-na-escola-superior-de-b1eae54e0c05

 

[author] [author_image timthumb='on']https://docmanagement.com.br/wp-content/uploads/2017/02/newton-thumbnail.jpg[/author_image] [author_info]Newton Fleury

Autor, consultor e professor com foco em inovação e estratégia, processos de negócio, gestão da informação e do conhecimento e tecnologias de apoio à gestão.[/author_info] [/author]

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