Mobilidade: A próxima fronteira para o ECM

Em menos de três anos, a produção mundial de dispositivos móveis será superior à de desktops. A previsão é do instituto de pesquisa norte-americano IDC, que projeta para o fim de 2012 a distribuição global de 462 milhões de aparelhos habilitados com aplicativos, como smartphones e tablets. Os desktops perderão terreno, com cerca de 448 milhões de unidades distribuídas na mesma data. Diante dessa expansão acelerada, muitos analistas já afirmam que a hegemonia dos dispositivos móveis nas rotinas administrativas, em lugar dos PCs, é só uma questão de tempo.  

[private] Previsões à parte, a realidade já mostra fornecedores de hardware e software corporativos adequando suas ações para um mundo cada dia mais móvel. Nas empresas usuárias, novas gerações de profissionais familiarizados com os benefícios do BlackBerry, do iPhone e do iPad, entre outros, demandam que os recursos e dados que costumam acessar via desktop também estejam disponíveis nesses pequenos aparelhos. Na era da mobilidade, a tendência é que esses profissionais se “descolem” cada vez mais dos PCs e dos escritórios, tornando-se aptos a criar, editar, utilizar e reutilizar conteúdos onde e quando a necessidade de trabalho exigir.

É nesse cenário que a mobilidade em Enterprise Content Management (ECM) ganha posição de destaque nas estratégias de fornecedores e nas pautas de discussão das corporações. A evolução dos aparelhos e das tecnologias de segurança, a largura de banda maior e a preços mais acessíveis, além das demandas das empresas usuárias, são alguns dos fatores que impulsionam o desenvolvimento das ferramentas e interfaces que estendem recursos de ECM para além do desktop ou do laptop.

“É um caminho sem volta, ainda que a onda da mobilidade ainda não tenha estourado no Brasil”, avalia Luiz Orlandini, sócio-fundador da  YouMobi, focada em serviços de mobilidade e cloud computing. A exemplo de outros especialistas do setor, Orlandini aponta o lançamento do iPad como um dos motores importantes desse movimento. “São eles que permitirão transações com documentos mais extensos”, acredita.

O grande desafio das empresas, segundo Orlandini, é desenvolver projetos sem grandes impactos financeiros. “Ao contrário do que muita gente pensa, a compra dos aparelhos móveis é a parte menos dispendiosa. O maior custo está no desenvolvimento em si, nas tecnologias que alicerçam o investimento”, diz o especialista, revelando que um projeto de mobilidade que acompanha, da área de seguros, está paralisado porque os custos com software chegaram a R$ 2,5 milhões. Por outro lado, Orlandini se diz otimista quanto à popularização da computação em nuvem e das ferramentas móveis e, por consequência, declínio de custos. “Acredito que a interface móvel com servidores de ECM ficará mais dinâmica e mais segura, e as empresas que já partiram na frente irão usufruir de grande vantagem competitiva”, diz.

Walter Koch, diretor da ImageWare e consultor internacional em ECM, também aposta na irreversibilidade do ECM via smartphones e tablets, ainda que atualmente ele esteja restrito aos recursos de entrega e captura, que são dois dos pilares do ECM (além do  gerenciamento, armazenamento e preservação). Koch relata que o cenário lá fora está mais avançado, com forte popularização não apenas de scanners portáteis, mas também do próprio celular,. “Nos Estados Unidos, o uso do iPhone como dispositivo de captura de cheques está consolidado. Com ele, o usuário fotografa o cheque, roda software que faz a formalística do documento e providencia upload da imagem e dos dados do mesmo para o banco”, informa.

No Brasil, ele observa, em meio à sua clientela, a multiplicação de celulares com sistema operacional Windows e integrados com pacote Office e SharePoint que estão sendo usados para tarefas como download e tratamento de documentos, a exemplo de um notebook. “Também há leitores de PDF rodando tranquilamente nesses dispositivos”, informa.

Uso embrionário

A avaliação de Eduardo Campos de Oliveira, gerente de marketing e negócios da divisão de produtividade e colaboração da Microsoft Brasil, é que mobilidade em ECM ainda é muito incipiente no país, embora esteja mais avançada em multinacionais e recursos mais comuns, como acesso a correio eletrônico, estejam amplamente disseminados. Ele informa que os  projetos que decolaram concentram-se em empresas que conseguem, devido à natureza do negócio, justificar a solução móvel e, ao mesmo tempo, encaixá-la adequadamente em sua estrutura de custos. Cita como exemplo os negócios de seguros e previdência privada, que equipam seus técnicos com tecnologia para captura de imagens e informações em campo. “Mas o que prevalece são situações como as das operadoras de TV a cabo, por exemplo. Elas poderiam se beneficiar muito com uso de PDAs nas visitas dos seus técnicos, mas, talvez por questões de custos, ainda se valem de formulários preenchidos manualmente”, ilustra.

O executivo salienta, por outro lado, que a tendência de mobilidade em gestão de conteúdo é irreversível, inclusive porque a tecnologia já está significativamente difundida via PCs e notebooks, o que é um facilitador. “O acesso remoto aos recursos da rede, ao servidor de SharePoint e aos portais de intranet ganham forte impulso a cada dia, isso é visível”, diz Oliveira.

Um elemento que tende a contribuir muito para esse impulso do ECM móvel, segundo Oliveira, é a computação em nuvem, que promete tornar os investimentos mais simplificados e menos dispendiosos. Ele destaca que,  em sua plataforma de produtividade e colaboração, a Microsoft já oferece aos usuários diversas funcionalidades para acesso remoto, como sincronização de documentos do SharePoint com dispositivo móveis, por meio de suíte em nuvem denominada Business Productivity Online Suite (BPOS).

Composta pelo Exchange Online, SharePoint Online, Office Live Meeting e Office Communications Online, o BPOS custa a partir de US$ 10 por usuário/mês. “O profissional pode acessar todo o universo de documentos necessário para seu trabalho, dentro do portal de SharePoint, a qualquer hora e a partir de qualquer lugar, usando inclusive celular via rede GPRS. Pode disparar ordens para profissionais em campo, capturar, iniciar workflow, tudo isso sem necessidade de a empresa comprar hardware ou licença de software”, exemplifica.

Mas a maior expectativa da Microsoft é o sistema móvel Windows Phone 7, a grande aposta da gigante de software para disputar mercado com plataformas como iPhone e  Android. Ainda sem data para chegar ao Brasil, o sistema provê acesso nativo ao servidor de SharePoint. “Isso quer dizer que a ferramenta já vem instalada no celular e que o usuário só precisa digitar algumas informações para sincronizar os arquivos, baixando-os para o dispositivo e mantendo-os atualizados”, explica Oliveira. Como dica para iniciantes, ele lembra que a versão gratuita do SharePoint está disponível para todo cliente que tem o Windows server. “O SharePoint gratuito conta com funcionalidades suficientes para quem está começando a lidar com organização e gestão de conteúdo.  Por meio dela, a empresa pode experimentar e aprender, antes de partir para projetos mais complexos, como os que envolvem portal e mobilidade”, aconselha.

Passo a passo

Adriano Lino, gerente de Inteligência de Mercado da Research In Motion (RIM) para a América Latina, defende que mobilidade corporativa é conseguida passo a passo, e que os projetos seguem uma ordem de prioridade natural, dependendo da maturidade de TI de cada empresa. “Primeiro, correio eletrônico. Depois, acesso remoto a aplicativos mais sofisticados, como ERP e CRM. É apenas uma questão de tempo para mobilidade chegar ao ECM”, diz Lino.

Os usuários do aparelho BlackBerry, carro-chefe da RIM, contam com ferramenta de ECM já incorporada ao pacote de software que compõe a plataforma (BlackBerry enterprise server). “Não é novidade para nossos clientes”,  diz o gerente, lembrando que há quase dois anos a empresa lançou a versão 5.0 do BB enterprise server, que permite mapeamento de todos os servidores em rede e acesso a seus arquivos. “A partir do telefone,  o usuário acessa, abre, manipula e edita documentos em formatos diversos, como Office e PDF, e pode salvá-los no próprio aparelho ou no servidor”, diz.

Para garantir sua fatia de mercado, a estratégia da RIM inclui a oferta de soluções mais simples e a custos mais acessíveis, além da ênfase no que a fabricante considera diferenciais exclusivos do seu produto, como segurança. “Temos uma das criptografias mais fortes do mercado e um grande número de certificações nessa área”, diz. Outro diferencial citado por ele é a capacidade de compactação dos dados, que reduz o peso dos documentos em até 90%. O executivo também destaca a existência de uma rede de parceiros que trabalham na integração do BlackBerry com diversas ferramentas de ECM do mercado, inclusive SharePoint, para atender a necessidades específicas das empresas.

Qualidade da imagem

Na Xerox, o foco em 2010 foi transferir para o ambiente móvel toda a experiência adquirida pela fabricante em captura de documentos via scanner em ambiente fixo. Segundo  o diretor devendas para bancos e telecom da Xerox do Brasil, Inon Neves, a significativa melhora na qualidade da imagem gerada por celular possibilitou que os especialistas da Xerox desenvolvessem projetos que até pouco tempo eram inviáveis.

Dessa forma, a fabricante implementou nova solução em pelo menos duas empresas de telefonia locais. Ainda em fase piloto, os projetos consideram duas formas de uso de celular para captura de imagens usadas nos processos de negócios que exigem anexação e análise de documentos diversos de clientes, como RG e comprovante de residência. Em um primeiro caso, o celular é encaixado em alguma base para funcionar como se fosse um scanner.  A outra forma consiste de uso normal do aparelho em campo, sem apoiá-lo em nenhuma base fixa. “Neste caso, o desafio é maior, porque o uso livre do dispositivo pode afetar a qualidade da imagem”, diz.

A expectativa da Xerox é que a sua base atual de clientes comece a adotar a solução móvel já neste ano de 2011, mas apenas para a função de captura. “Ainda não prevejo forte utilização de dispositivo móvel para acesso a informação, porque baixar imagem exige muito processamento”, admite Neves. O custo não será problema – ele acredita, uma vez que o celular costuma ser mais barato do que o scanner e a solução será comercializada no modelo de software como serviço. A fabricante já está homologando cerca de quatro modelos de celular – nem todos classificados como smartphones. “Eles serão usados pelos profissionais  para captura de imagens que serão transmitidas para dentro do DocuShare, que é a  plataforma de gestão de conteúdo da Xerox, a qual cuida da gestão tradicional do ECM”, diz Neves.

O diretor da Xerox é um dos que não vê mais sentido nas estratégias de ECM que não consideram o ambiente móvel. “A mobilidade pode reduzir um dos grandes custos que se tem nesse mundo de conteúdo, que é justamente a captura e o transporte de documentos de um lado paro outro”, diz, destacando, como exemplo, os benefícios que o processamento de cheques por imagem (truncagem) trará aos bancos do país. “É verdade que nenhum banco vai fazer essa captura via smartphone, e sim por scanner. Mas o caminho natural é para sistemas como o norte-americano Cheque 21”, acredita Neves. Em vigor desde 2004, o Cheque 21 (21st Century Act) legaliza e regulamenta o uso da imagem de cheques nos Estados Unidos. “Lá, o cliente do banco já usa o celular para capturar e transmitir a imagem do seu cheque. É a tendência, embora o Brasil ainda tenha de avançar muito na redução de riscos relacionados com fraude”, avalia.

Solução na prateleira

Na carteira de clientes da TOTVS, cerca de 2.500 empresas de diversos segmentos utilizam o ByYou ECM. Nem todas essas empresas, entretanto, contrataram a ferramenta que permite o acesso móvel a esses recursos. “Mas todas sabem que a opção está na prateleira, pronta para uso assim que o negócio demandar”, diz Weber Canova, vice-presidente de tecnologia e inovação da TOTVS.

De acordo com o executivo, devido às limitações do aparelho móvel, a TOTVS optou por identificar as principais demandas dos seus clientes. A solução conta com portal e permite tarefas como consulta a documentos e workflow por meio de aparelhos como iPad e iPhone. Canova acredita que as constantes melhorias na resolução de imagens captadas por celular irão estimular cada vez mais o processo de captura móvel de documentos e projetos de ECM móvel focados nas necessidades específicas das empresas.

Antes disso, porém, é preciso que o uso convencional do ECM se consolide nas empresas, abrindo caminho para extensão do conceito ao mundo móvel – defende Canova. Nesse sentido, a estratégia da TOTVS inclui levar o sistema de ECM para além das grandes corporações, beneficiando também o segmento de SMB.  “Desenvolvemos uma solução agnóstica, talhada para o mercado brasileiro e com custos mais atraentes do que as equivalentes de grandes marcas multinacionais. Está em ritmo forte de adoção”, comemora o  vice-presidente.

Mercados verticais

Mas não são apenas as grandes fabricantes e multinacionais de software que estão empenhadas em expandir para o ambiente móvel os recursos de gestão de conteúdo. Empresas focadas em mercados verticais, como a I4PRO, que fornece software para o segmento de seguradoras, também estão empenhadas em garantir o seu quinhão no mercado de ECM e mobilidade.

Mauricio Ghetler,  diretor de marketing e vendas da fabricante, diz que nenhum novo cliente da companhia adquire o seu ERP sem o ECM integrado. “Porque é fácil e pouco dispendioso contar com mais esta camada de software que permite que o usuário, a qualquer momento do fluxo de serviços do ERP, recupere e armazene conteúdos digitais que façam parte do contexto da aplicação”, explica. Ele admite que, de uma forma geral, muitas empresas ainda se sentem mais seguras adquirindo sistemas de grandes marcas internacionais. Mas garante que, pelo menos no âmbito da sua carteira, esta percepção não prevalece mais.

Os processos de seguros das empresas clientes da i4PRO são levados ao ambiente móvel por meio de uma ferramenta genérica, o I4PRO MMI (de mobile management interface). “Essa interface facilita muito o trabalho em campo em cotações de seguros e regulação de sinistros, entre outras tarefas. Por intermédio dela, os usuários dos softwares da I4PRO podem acessar os sistemas ERP/ECM independentemente da plataforma do aparelho, seja iPhone, Android, Windows Phone ou BlackBerry”, diz Ghetler. Ele relata que, antes de disponibilizar o produto, os especialistas da I4PRO criaram um perfil de usuário com base no qual definiram apenas as telas essenciais e com interface modificada, para tornar mais confortável a navegação nas telas reduzidas dos aparelhos móveis.  “Consideramos que nem todas as telas do ERP podem ou precisam ser reproduzidas em um smartphone”, diz o executivo.

O diretor da I4PRO está entre os que enxergam importantes limitações para expansão dos recursos de ECM, em sua plenitude, nas telas reduzidas dos dispositivos móveis. “Um iPhone pode ser adequado para captura de imagens, mas sua tela miúda não favorece o download e manuseio de planilhas e documentos PDFs, por exemplo. Por outro lado, o iPad é grande demais para ser carregado no bolso”, avalia o executivo.

Apesar dos desafios citados por Ghetler e demais especialistas, a opinião de todos convergem para um ponto: a mobilidade em ECM, apesar das barreiras e das dúvidas quanto à sua amplitude, é uma questão apenas de tempo. Já quanto aos segmentos empresariais que serão beneficiados em curto ou médio prazos, há controvérsias. Enquanto os fornecedores de software apontam suas estratégias para o SMB, especialistas em ECM, como Koch e Orlandini, destacam os altos investimentos necessários em projetos de mobilidade.  “Em geral, o mundo móvel ainda não é para pequenos”, sentencia Koch, da ImageWare.

Três degraus do ECM móvel

Analistas do mercado de ECM destacam as principais etapas do conceito no ambiente móvel. Confira:

Acesso móvel a repositório ECM – seria o primeiro nível do ECM móvel. É onde a maioria dos principais fornecedores está (ou está a caminho). Destacam-se as entregas de interfaces móveis específicas para produtos de ECM, como aplicações para BlackBerry, iPhone ou Android, além da busca baseada em browser.

Acesso móvel a múltiplos sistemas de ECM via CMIS compatível com navegadores de celular – o padrão de comunicação via web services, Content Management Interoperability Services (CMIS), que permite interação entre repositórios independentemente do fornecedor ou infraestrutura tecnológica, pode garantir acesso a um ou mais sistemas de gerenciamento a partir de interface única.

Aplicações móveis centradas em conteúdo (content-centric) - A terceira onda do ECM móvel envolve aplicações concebidas especificamente para dispositivos móveis. Destaca-se nesse estágio a nova geração de plataformas e arquiteturas de ECM baseada em nuvem, que pode simplificar e baratear os investimento e ajudar as empresas a se manterem inovadoras e criativas na geração, captura e utilização de conteúdos eletrônicos.
Fonte: CMS Wire/2010  [/private]

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