Por Flavia Meleras e Mario Thadeu Leme de Barros Filho
A pandemia provocada pelo Covid-19 está forçando o planeta inteiro a abraçar o mundo digital abruptamente. Em relação ao professor, a pergunta é: quais são os desafios nessa nova tarefa? Poucos estavam prontos para uma plataforma 100% digital de trabalho e muitos foram agora obrigados a fazê-lo às pressas.
É muito importante capacitar os professores para o uso das plataformas tecnológicas. Entretanto, para além das práticas de ensino à distância, não podemos esquecer que é de vital importância os conscientizar sobre os códigos, regras, riscos, perigos e segurança da informação no mundo digital, ou seja, como usar a Internet de forma consciente e responsável.
O fato de estarmos vivendo uma pandemia faz com que mais do que nunca tenhamos que estar alertas e cientes dos riscos existentes. Os professores, além de gerar conteúdos que se adaptem ao mundo online, precisam trabalhar a interatividade ao vivo com os alunos e colaborar com a construção do conhecimento em um ambiente digital de relações sociais. A conexão à distância, com documentos, vídeos, contos, fotografias enviadas e o eventual retorno por parte dos alunos, nas mais variadas linguagens, configuram a nova sala de aula. A qualidade do ensino e a relação com os alunos, pais, professores e coordenadores deve permanecer em alto nível.
Alguns professores buscam dicas para evitar ficar perdidos, expostos e sob risco nesse mundo digital. São temas fundamentais: a segurança das pessoas e da informação; a proteção de dados pessoais e privacidade; direitos e danos de imagem e reputação digital; cyberbullying; capacitar o professor na plataforma de ensino no intuito de ajudar os alunos a não se exporem na Internet; e definir seu papel na plataforma de ensino e ajudar os alunos a não se exporem na Internet.
A questão de segurança é fundamental, pois muda tudo quando a sala de aula é online. É importante que o professor conheça como funcionam as plataformas que a sua instituição de ensino escolheu para o ensino à distância, os termos e condições de uso e a sua segurança.
Algumas dicas são: orientar os alunos para não compartilhar o link de acesso à videoconferência a terceiros; pedir a adultos que acompanham os alunos crianças e adolescentes que, na hora de configurar o usuário, coloquem o nome e sobrenome exato dos alunos, e não apelidos ou nomes dos pais ou responsáveis; lembrar que microfones e câmeras devem ser fechados no final da conversa, assim como colocar um adesivo que cubra a câmera do computador na hora de dormir; e professores, ao usarem computadores ou outros dispositivos, tomarem cuidado ao compartilharem documentos, imagens e vídeos que não sejam relacionados à sala de aula e ao tema que pretendem abordar.
Em relação à proteção de dados pessoais e a privacidade, vale lembrar que a entrada em vigor da nova Lei de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) está prevista para agosto de 2020. No momento, não se sabe exatamente como será operacionalizada. De qualquer forma, é importante ter em conta que todos os registros de trabalhos dos alunos, anotações pessoais e, ainda, qualquer tipo de dado sensível guardado pelo professor, dentro ou fora da plataforma, deve ser armazenado e mantido com segurança. Dessa forma, é essencial manter as boas práticas já existentes no mundo offline, tal como criptografar dados, o que geralmente cabe aos profissionais de TI das instituições.
Sobre os diretos e danos de imagem e reputação digital, é essencial relembrar aos alunos e aos seus responsáveis que, mais do que nunca, o respeito aos direitos de propriedade intelectual e imagem continuam vigentes. Uma boa alternativa seria elaborar um lembrete sobre o assunto e disponibilizar na plataforma para acesso permanente de alunos e responsáveis acessarem.
É cada vez mais comum os alunos tirarem fotos das aulas, prints de telas ou as registrarem em vídeo ou áudio. Muitos desses registros são posteriormente publicados em redes sociais sem o consentimento específico dos registrados ou de seus responsáveis. Em relação à instituição de ensino, vale lembrar que ela pode ter, mediante o contrato firmado quando da matrícula, autorização para publicar fotografias ou vídeos dos alunos em sites, folhetos, jornais ou outros informativos para fins educativos. Mas essa autorização não se estende ao professor e aos alunos, pessoas físicas.
Compete ao professor cuidar e administrar a sala de aula online, assim como colocar regras de conduta, o que leva também à questão do cyberbullying.
Sempre é importante reforçar aos alunos que os bons hábitos e condutas devem se manter online e todos os professores sabem que o bullying não é brincadeira. Caso o professor note uma conduta intencional, repetitiva, mal-intencionada entre pares na sala de aula online, deve levar o assunto à coordenação e intervir o quanto antes. Não deixe de chamar a atenção em caso de ofensas mascaradas de brincadeiras, insultos, apelidos pejorativos. No entanto, o professor deve tomar cuidado quanto à forma dessa abordagem online, com vistas a não prejudicar a autoestima do aluno envolvido ou mesmo abrir portas para que outros alunos se sintam no direito de fazer o mesmo.
Por fim, é fundamental definir o seu papel na plataforma de ensino e ajudar os alunos a não se exporem na Internet.
No caso de crianças que precisam de ajuda dos responsáveis na plataforma, é importante refletir como transmitir para os pais que a aula online é de responsabilidade dos alunos, não devendo os responsáveis intervir ou interagir quando uma aula interativa for ao vivo. Também devem relembrar aos responsáveis de escolher um lugar reservado na casa para fazer as aulas.
Para os alunos jovens, principalmente adolescentes, é bom relembrá-los tudo o que pode acontecer nas redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas. Alertar para não deixarem o perfil aberto, configurarem o perfil de visualização só para os amigos, para não aceitarem amigos desconhecidos, tomarem cuidados com os comentários, grupos e compartilhamentos que fazem nas redes sociais. Reforçar que, para qualquer pessoa, o que acontece na Internet, dificilmente some ou se apaga.
O professor é um dos maiores influenciadores na vida de seus alunos e, agora, também virou um influenciador online. Portanto, ser um bom exemplo na Internet faz toda a diferença e colaborará na construção de uma compreensão de cidadania e responsabilidade social digitais.
Flavia Meleras é advogada, Phd em Direito Digital, especialista em Proteção de Dados e Privacidade, professora das Universidades ORT e da República do Uruguai, consultora do Direito Digital do escritório BFAP Advogados.
Mario Thadeu Leme de Barros Filho é advogado, doutor em Direito Constitucional, professor do Curso de Medicina da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde do Hospital Albert Einstein e sócio fundador do escritório BFAP Advogados.