Investimento Trilionário em Inteligência Artificial

Investimento Trilionário em Inteligência Artificial

Por José Saul Moscati, Sócio da Consultoria DGT – Digital Transformation, Especialista em Privacidade de Dados e Responsible AI, Formado em Direito pela Universidade de São Paulo, LLM – London University (King’s College), Especialista em Direito Tributário pela FGV e Administração de Empresas pela FECAAP.

Um trilhão de dólares em CAPEX… Este é o valor que as big techs e empresas relacionadas vão investir em inteligência artificial nos próximos anos, segundo o Relatório do Banco de Investimentos Goldman Sachs (1). Este investimento garantirá anos de diversão criando figurinhas e vídeos com IAs, ajudará estudantes a fazer trabalhos escolares (independentemente de ser uma prática boa ou não) e responderá nossas perguntas sobre assuntos aleatórios. Tudo de graça, pois o investimento trilionário para montar e manter a infraestrutura e softwares dos data centers com milhares de chips será bancado pelas big techs e seus investidores.

Somente em energia para rodar os datacenters, nos Estados Unidos, são estimados 47 gigawatts de energia adicional até 2030, segundo Brian Janous (Co-fundador da Cloverleaf Infrastructure e ex-Vice-Presidente de Energia da Microsoft). Será um tremendo desafio acrescentar tanta energia ao grid norte-americano de forma concentrada em um espaço de tempo tão curto, algo jamais visto em nossa geração.

Esta exuberância de investimentos beneficiará toda a cadeia de suprimentos, desde as mineradoras de matéria-prima para fazer os chips até os programadores que desenvolverão os softwares. Para a economia dos Estados Unidos, o relatório apresenta uma gama de previsões de crescimento dos especialistas:

• Daron Acemoglu, Professor do MIT: “Estima que apenas um quarto das tarefas expostas à IA serão econômicas para automatizar nos próximos 10 anos, o que implica que a IA afetará menos de 5% de todas as tarefas.”

• Joseph Briggs, Economista Sênior Global do Goldman Sachs: “Estima que a geração AI acabará automatizando 25% de todas as tarefas de trabalho, aumentando a produtividade dos EUA em 9% e o crescimento do PIB em 6,1% cumulativamente na próxima década.”

Mas, na prática, o que isso significa, aqui e agora, para o gestor de Tecnologia?

Para empresas cujos produtos estão diretamente relacionados aos produtos da IA generativa, como aquelas que geram e manipulam textos, códigos de software e imagens, o impacto é imediato e direto.

Não há como sobreviver sem o uso dessas ferramentas. A preponderância dessas empresas nos meios de comunicação garante a divulgação e amplificação dos impactos, com discussões sobre responsabilidade dos meios de comunicação, perda de empregos, direitos autorais, deep fakes etc., o que acaba mistificando e amplificando os impactos, tanto positivos quanto negativos. No entanto, em empresas com outras cadeias produtivas, como na área médica, varejo, extrativista, indústria, comércio e serviços, o impacto não é tão óbvio e merece uma discussão séria e técnica. Números referentes aos impactos no crescimento do PIB, produtividade geral etc., são importantes, mas são uma média global, por país ou indústria. Tais dados são muito amplos e especulativos para serem usados de forma realmente útil em uma análise de negócios. A informação de que a IA automatizará entre 5% e 25% das tarefas de trabalho tem relevância muito pequena na gestão de uma empresa e muito menos de uma área específica da empresa.

A pergunta a ser respondida é: Qual o ganho em produtividade e qualidade que a IA gerará em uma área específica e na empresa?

Com isso, o hype se dissipa e começa o trabalho de fato. A resposta dependerá da análise do caso específico.

Em um projeto real na área médica, já em operação há alguns anos na DGT, observamos uma redução de 70% no número de funcionários dedicados à revisão de laudos médicos, com incrementos ainda mais significativos no prazo de liberação do laudo para o paciente e médico. O processo anterior, manual, requeria que um profissional comparasse os dados fornecidos por exames de ultrassom com o laudo fornecido pelo especialista, em busca de divergências para aumentar a acuracidade do resultado apresentado. No processo com o auxílio da IA e inserido no processo de qualidade da empresa, a comparação inicial é feita pela IA comparando imagens ao laudo digitalizado pelo médico, que avisa o profissional revisor caso encontre divergências ou disponibiliza automaticamente no portal se não encontrar qualquer divergência. O processo, como um todo, supera a análise média de ganhos de eficiência e melhoria da qualidade de informações.

Não que as previsões de ganhos de eficiência estejam erradas ou subdimensionadas, mas são médias que incluem casos de grande e pequeno impacto. Poucas empresas implementariam uma IA buscando ganhos de apenas 5%.

É importante notar que a redução de 70% no número de funcionários não é somente devido ao uso da IA; ela está inserida em um contexto de automação de um processo produtivo. O impacto na eficiência geral de uma área e de uma empresa com o uso de IA não ocorre no vácuo; é preciso que a IA esteja inserida em um processo a ser automatizado incluindo o entendimento do potencial retorno dos benefícios.

Em se tratando de IA e automação, principalmente na área médica, os ganhos com a redução de recursos não são o único benefício, nem a única preocupação. A qualidade, rapidez e segurança são essenciais e geram benefícios e ganhos difusos para a empresa, mas também exigem análise e monitoramento na área de segurança da informação, privacidade de dados e Responsible AI (IA responsável, que são normas e padrões de segurança e ética que regem a implementação de uma IA. Este tema será objeto de um artigo específico).

A mesma tecnologia de IA e reconhecimento de imagem tem um potencial ainda maior que pode ser utilizada na leitura de documentos digitalizados ou manuais, como notas fiscais de serviços, pedidos médicos, documentos de pacientes, solicitação de serviços laboratoriais, entre outros, que com a combinação entre leitor de documentos e IA, elevam substancialmente a assertividade da leitura, além de reduzir as necessidades de digitação por funcionários, acelerar os processos de faturamentos junto as operadoras, entre outros.

Voltando ao Relatório do Goldman Sachs, isso também é abordado pelo Professor do MIT, Daron Acemoglu: “As diferenças de previsão parecem girar mais em torno do momento dos impactos econômicos da IA do que da promessa final da tecnologia. A IA generativa tem o potencial de mudar fundamentalmente o processo de descoberta científica, pesquisa e desenvolvimento, inovação, testes de novos produtos e materiais, etc., bem como criar novos produtos e plataformas. Mas, dado o foco e a arquitetura da tecnologia de IA generativa hoje, essas mudanças verdadeiramente transformadoras não acontecerão rapidamente e poucas, se houver, provavelmente ocorrerão nos próximos 10 anos. Nesse horizonte, a tecnologia de IA aumentará principalmente a eficiência dos processos de produção existentes, automatizando certas tarefas ou tornando os trabalhadores que executam essas tarefas mais produtivos. Portanto, estimar os ganhos de produtividade e crescimento da tecnologia de IA em um horizonte mais curto depende totalmente do número de processos de produção que a tecnologia afetará e do grau em que essa tecnologia aumenta a produtividade ou reduz os custos nesse período.”

Concluindo, as aplicações de IA abrem um leque de possibilidades para aumento de produtividade e incremento de qualidade fantásticos e alterarão, de forma disruptiva, a forma que vivemos e produzimos e quando inseridas nas várias aplicações e soluções, será parte essencial para os processos e para as automações. Desmistificar e entender o seu uso no caso concreto é algo essencial e mandatório para todos os segmentos de empresas, sendo este, o primeiro passo para que possamos colher os benefícios da IA.

Imagem: Imagem de Tung Nguyen por Pixabay

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