PORQUE AS ORGANIZAÇÕES NÃO APRENDEM?

PORQUE AS ORGANIZAÇÕES NÃO APRENDEM?

Apresentação

A maioria dos gestores acredita que para uma empresa se manter competitiva ela deve aprender a se aprimorar diariamente, no entanto, mesmo as organizações admiradas pela dedicação nesse quesito encontram dificuldade para praticar o que aconselham.

Considere a Toyota. Melhorar constantemente é um dos pilares de sua famosa filosofia de negócio. Depois que sérios problemas no final de 2009 a levaram a fazer o recall de mais de 9 milhões de veículos em todo o mundo, seus líderes confessaram que a busca para se tomar o maior produtor de automóveis dos quatro continentes havia comprometido sua dedicação à aprendizagem.

Por que empresas enfrentam dificuldades para se transformar em uma "organização em permanente aprendizado"? Alguns vieses podem nos levar a nos concentrar demais no sucesso, tomar medidas muito rapidamente, nos esforçar em excesso para nos ajustar ou depender muito de especialistas. Neste artigo vamos discutir como essas tendências humanas profundamente enraizadas podem interferir na absorção de conhecimento e de que maneira podem ser enfrentadas.

Boa Leitura!

Lenildo Morais.

1) Introdução

Tradicionalmente, as empresas competiam com base em tecnologia, conhecimentos técnicos,

capacidade instalada e atributos relacionados à produção. Porém, com as inúmeras transformações que vem ocorrendo nos últimos anos e a necessidade da mudança organizacional, o capital humano e a liderança intelectual da empresa passaram a ser prioridades organizacionais.

Para que uma empresa seja bem sucedida, são necessárias pessoas com visão estratégica do negócio. Para se desenvolver esta visão estratégica é preciso a introdução de modelos de aprendizado organizacional visando a criação de uma organização que aprende. Neste tipo de organização, todos ensinam e aprendem a todo momento. As organizações que aprendem devem ser vistas como sistemas onde suas ações levam a criação e compartilhamento de conhecimento entre seus membros.

O reconhecimento desse fato leva muitas empresas a repensar sobre sua responsabilidade na formação de seus funcionários. A visão do treinamento como sendo periódico e generalizado não existe mais. Hoje as organizações precisam assumir o compromisso de atualizar continuamente as aptidões de seus funcionários.

Sendo assim, é cada vez maior o número de gestores interessados em compreender e fortalecer a capacidade de aprendizagem de suas empresas. Há uma preocupação crescente na transformação das organizações em lugares onde se ensina e se aprende continuamente e esse processo deve envolver todos os integrantes da empresa.

 

2) Viés de Sucesso

Muitos gestores, de diversas organizações, podem até afirmar que o aprendizado vem com os erros, mas suas ações mostram que a preocupação é com o sucesso. Até aqui, nenhuma novidade. O fato é que o foco nesse aspecto pode ser excessivo e dificultar a aquisição de novas competências. A seguir estão três dificuldades relacionadas com essa atitude.

  • Medo do Fracasso

Falhar pode desencadear uma sequencia de emoções, mágoa, raiva e vergonha. Em casos mais graves, até mesmo um distúrbio de humor, como a depressão. Tentamos evitar erros a todo custo e, quando acontecem, a nossa tendência é tentar varrê-los para debaixo do tapete. Esta inclinação natural pode ser agravada em empresas onde os líderes institucionalizam, muitas vezes sem perceber, o temor do fracasso. Muitos estruturam projetos de modo que não sobre tempo ou dinheiro para a experimentação ou oferecem bônus e promoções para aqueles que cumprem metas e prazos. Mas, a menos que os gestores sejam capazes de tolerar as falhas e insistir em discuti-las abertamente, dificilmente a organização poderá desenvolver novas capacidades ou assumir riscos;

  • Mentalidade Fixa

Há dois modos básicos de raciocinar, o modo "fixo" e o modo "de crescimento". No primeiro caso, as pessoas tendem a acreditar que a inteligência e o talento são principalmente uma questão genética. Você tem ou não tem. Costumam tentar parecer inteligentes sempre e enxergar o fracasso como algo a ser evitado a qualquer custo, temendo que falhar possa marcá-las como incompetentes. A mentalidade fixa limita a capacidade de aprender na medida em que leva os indivíduos a se concentrar demais em ter bom desempenho.

Por outro lado, pessoas com mentalidade de crescimento preferem buscar desafios e oportunidades de aprendizagem. Faz mais sentido para elas a ideia de que, independentemente da própria capacidade, sempre é possível melhorar com esforço e prática. Quem tem esse perfil não costuma enxergar o fracasso como sinal de inadequação e, em geral, gosta de assumir riscos.

  • Viés de Atribuição

É comum atribuirmos nossos sucessos ao trabalho duro, ao talento e às habilidades em vez de à sorte. No entanto, somos rápidos em culpar o acaso por nossos fracassos. Esse fenômeno, conhecido como viés de atribuição, dificulta a aprendizagem. De fato, a menos que reconheçamos que as falhas resultam de nossas próprias ações, dificilmente aprenderemos com nossos erros.

Os métodos a seguir podem ajudar gestores a encorajar os outros a identificar o lado positivo dos erros, adotar uma mentalidade de crescimento, focar no potencial e superar o viés de atribuição. É indicado que líderes enfatizem constantemente que falhas são oportunidades de aprender, e não motivo de constrangimento ou punição, e ajam de maneira que essa mensagem seja reforçada. Deve-se perguntar algo como: "Você assume riscos no trabalho?" e "Aprender com as falhas é algo incentivado formalmente?". As respostas ajudam os gestores a compreender se a organização tem uma cultura que aceita os erros e os discute abertamente; caso contrário, quais medidas podem ser tomadas.

O líder que desafia as próprias ideias sobre o quanto uma pessoa pode melhorar faz diferença. Gestores com esse perfil tendem a notar mais progressos dos funcionários, diferentemente daqueles com mentalidade fixa, mais presos a impressões iniciais. Passar adiante a ideia de se desenvolver constantemente permite que as pessoas se tomem mais conscientes das oportunidades de autoaperfeiçoamento, fiquem mais dispostas a abraçar desafios e persistir quando enfrentam obstáculos. Portanto, não deve-se deixar de dizer aos funcionários que você acredita que, com esforço, eles podem expandir o talento. Mostrar dados científicos sobre a mentalidade de crescimento e histórias de empregados de alto desempenho que se dedicaram ao trabalho e desenvolveram competências com o tempo ajuda a reforçar essa mensagem. Finalmente, deve-se procurar elogiar os esforços de aprendizagem em avaliações de desempenho formais e informais.

Considerar o potencial na hora de contratar e promover é primordial. Agir assim, e deixar isso claro para os funcionários, pode ajudar a evitar impressões incorretas. Também incentiva os empregados a tentar coisas novas e buscar apoio no desenvolvimento das suas competências. Levar em conta o potencial de progresso tende a evidenciar pessoas que de outra forma talvez não fossem consideradas para uma vaga ou promoção.

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3) Abordagem baseada em dados para identificar o que colaborou para o sucesso ou para o fracasso

Grande parte dos gestores sabe que informações precisas são fundamentais para descobrir o que está por trás de bons resultados, embora nem sempre insistam em recolher e analisar os dados necessários. A investigação minuciosa posterior de projetos com base em dados, mesmo os de sucesso, ressalta que até os empreendimentos criativos, como a produção de filmes, envolvem atividades e resultados que podem ser medidos. Os dados ajudam a mostrar as coisas de forma mais neutra, o que pode estimular o debate e desafiar os pressupostos decorrentes de impressões pessoais.

Claro, coletar informações é um cenário, aceitar o que nos dizem é outro. Trabalhamos com diversas organizações em que "tomada de decisão orientada por dados" é um código para distorcer os fatos até que revelem o que a gerência sênior espera. É papel dos líderes garantir que eles próprios e outros executivos sejam sensíveis a essa tendência e não dobrar-se a ela.

Como costuma-se responder quando se depara com um problema na organização? Se for como a maioria dos executivos, a tendência é optar por tomar alguma atitude. Trabalhar mais, ficar até mais tarde e colocar pressão extra sobre si mesmo. É comum nos sentirmos mais confortáveis quando agimos, mesmo que seja contraproducente e não fazer nada seja o melhor no momento.

Considerando, por exemplo, goleiros profissionais e as suas estratégias para defender chutes de pênalti. Aqueles que ficam no centro do gol, em vez de saltar para a direita ou para a esquerda, se saem melhor. No entanto, eles ficam nessa posição na maioria do tempo. Por quê? Para eles é melhor perder a bola se movimentando, mesmo que seja para a direção contrária, do que ficar parado e tomar um gol.

A mesma aversão à falta de ação é verdade no mundo dos negócios. Quando examinamos os participantes em nossas aulas de educação executiva, observamos que os gestores costumam se sentir mais produtivos na hora de executar as tarefas do que estudando-as. Principalmente quando estão sob pressão de tempo, é comum perceberem o planejamento como um esforço desperdiçado. A seguir estão dois motivos pelos quais esse viés de ação pode prejudicar o desempenho.

  • Exaustão

Não é nenhuma novidade que funcionários esgotados não se animem a aprender algo ou aplicar o que já dominam. Caso, os funcionários da área da saúde deixem de se cumprimentar de mãos lavadas, algo amplamente conhecido como essencial para prevenir infecções hospitalares. A queda é ainda maior caso os profissionais tenham um dia especialmente agitado. No entanto, passam a se cumprimentar mais com as mães lavadas quando puderam contar com mais tempo de folga entre os plantões;

  • Falta de Reflexão

Estar "sempre ligado" não permite às pessoas discernir entre ações adequadas e ações ineficazes. Considere o exemplo de funcionários durante as primeiras semanas de treinamento. Todos passaram pela mesma capacitação técnica, mas com uma diferença chave. A partir de alguns dias, alguns tiveram os últimos 15 minutos diários para refletir e escrever sobre as lições que tinham aprendido naquele dia. Os outros, do grupo, apenas continuaram a trabalhar pelo período restante. No teste final do treinamento, depois de um mês, aqueles que tiveram tempo para refletir se saem 20% melhor, em média, do que os outros participantes.

As sugestões a seguir para lidar com o problema podem parecer óbvias, mas raramente são aplicadas.

1) Programar Pausas

Certifique-se de que os funcionários tenham tempo suficiente para se revigorar e refletir durante o dia de trabalho e entre os turnos. Em muitas organizações, quem trabalha por hora tem esse direito ou até mesmo é solicitado a fazer pausas periódicas.

Quando se trata de alguns cargos de gerência e de funcionários da área do conhecimento, é óbvio, não há pausas obrigatórias. Essas pessoas costumam decidir por si próprias o momento de descansar e recuperar as energias. Além disso, profissionais com esse perfil, em geral, reconhecem que conversas livres colaboram para a aprendizagem. E concordam que é preciso dormir o suficiente e tirar férias. No entanto, nem sempre praticamos o que dizemos. Mais de um quarto das empresas, no mundo inteiro, não fazem nenhum intervalo fora do almoço. No entanto, 90% dos gestores encorajam as pausas e 86% dos funcionários concordaram que breves momentos de descanso do trabalho contribuem para o aumento da produtividade. Os benefícios são ainda maiores quando saímos do escritório ou fazemos pequenas caminhadas. Deve-se esquecer a ideia de almoçar na mesa de trabalho. Isso pode melhorar o humor dos funcionários, revigorá-los e permitir que executem melhor as tarefas e aprendendo ainda mais.

2) Tirar um Tempo Apenas para Pensar

Da mesma forma que se reserva um horário na agenda para planejar uma iniciativa ou uma apresentação, deve-se reservar um curto período, diariamente, mesmo que de apenas 20 ou 30 minutos, para preparar os compromissos, no início da manhã, ou pensar sobre como foi o dia, no final da tarde.

Se o tempo estiver muito escasso, deve-se tentar refletir no caminho para o trabalho ou na hora de voltar para casa. Aqueles funcionários que eram incentivados a planejar o dia durante a viagem eram mais felizes, menos estressados e mais produtivos do que aqueles que tinham esta prática.

3) Estimular a Reflexão após as Tarefas

Isso pode ajudar a entender melhor as ações que passam pela cabeça e as chances de que contribuam para a produtividade. Algumas empresas já têm tentado encontrar maneiras de incorporar a reflexão nas atividades regulares. Uma poderosa abordagem considera esse hábito como uma ferramenta analítica para entender os elementos que colaboram para o sucesso ou para o fracasso. O exército dos Estados Unidos é bem conhecido por suas revisões pós-ação, AARs, na sigla em inglês. Para garantir que um rigoroso processo seja seguido, essas análises são executadas por um facilitador, em vez de um gerente de projetos. Uma AAR eficaz consiste em comparar o que de fato aconteceu com o que deveria ou poderia ter ocorrido e, em seguida, diagnosticar cuidadosamente as diferenças, positivas e negativas.

Seja refletindo coletiva ou individualmente, é preciso manter algumas questões em mente. Antes de tudo, deve-se lembrar que o objetivo é aprender. Isso significa ser honesto consigo mesmo, um facilitador externo pode ajudar a garantir as configurações do grupo. Um outro ponto importante é tentar obter uma imagem completa e precisa do que ocorreu. Isso exige usar dados e considerar múltiplas perspectivas. Em terceiro lugar, deve-se trabalhar para chegar à raiz de por que as coisas aconteceram de determinada forma. Finalmente, pensar sobre como o trabalho poderia ser aprimorado. Além dos ajustes óbvios no processo, é importante reservar um tempo para imaginar como agiria de forma completamente diferente se pudesse.

4) Viés de Adaptação

Quando entramos numa organização, é natural querermos nos adaptar. A seguir estão duas dificuldades em relação ao aprendizado a que essa tendência pode nos levar.

1) Acreditar que precisamos nos enquadrar

No início da vida, percebemos que podemos nos beneficiar ao seguir normas e regras sociais e organizacionais. E fazemos um esforço significativo para aprender e aderir aos códigos escritos ou não de comportamento no trabalho. No entanto, isso também pode nos trazer problemas, como limitar o que oferecemos para a organização. Como a célebre frase de Steve Jobs esclarece: "Não faz sentido contratar pessoas inteligentes e lhes dizer o que fazer; escolhemos esses indivíduos para que eles digam como devemos agir". De fato, não ter medo de se destacar pode ganhar o respeito dos superiores, embora muitos acreditem o contrário. Comportamentos fora da norma, como chamar a atenção de alguém durante uma reunião de negócios ou usar o próprio tema do PowerPoint em vez do modelo da organização, tendem a aumentar o status da pessoa e a ideia de competência que fazem dela;

2) Deixar de usar o próprio potencial

Quando os funcionários se adaptam ao que acreditam que a organização quer, eles ficam menos propensos a agir com naturalidade e tirar proveito dos próprios pontos fortes. Responder afirmativamente à pergunta "No trabalho, você tem oportunidade de executar o que faz de melhor todos os dias?" é um preditor significativo de comprometimento e alto desempenho operacional. Quando as pessoas se sentem livres para se destacar da multidão, elas podem mostrar suas forças, como curiosidade, interesse em aprender e perseverança, identificando oportunidades para melhorar e sugerindo como explorá-las.

5) Incentivando as Pessoas a Cultivar seus Pontos Fortes

Para motivar e apoiar os funcionários, algumas empresas permitem que invistam certa parte de seu tempo com a atividade que quiserem. Embora essa prática seja valiosa, acreditamos que as organizações devam se esforçar para ajudar as pessoas a aplicar seu potencial diariamente, como parte do trabalho.

Para isso, os gestores devem ajudá-las a identificar e desenvolver essas características, e não apenas discuti-las em revisões anuais de desempenho. Oferecer um feedback positivo é um método eficaz para impulsionar os funcionários. Faz muita diferença quando amigos, familiares e mentores compartilham histórias sobre como tal pessoa se destaca no trabalho. Essas lembranças desencadeiam emoções positivas e nos levam a perceber o impacto que causamos nos outros, o que nos torna mais propensos a tirar proveito de nossos pontos fortes em vez de apenas tentarmos nos enquadrar.

Essa abordagem tem ajudado um grande número de empresas a resolver alguns problemas. Seus funcionários tendiam a ver o emprego como um contrato de dinheiro por trabalho. Além disso, muitos faziam o mínimo, em vez de tentar criar resultados em que empresa e funcionário ganhassem. Observamos que elogios, feitos durante o processo de integração ou orientação, favoreceram uma relação mais pessoal e menos transacional entre empregados e organização. E mais, há correlação entre a intervenção e a menor rotatividade de funcionários no ano seguinte e melhor desempenho. O foco no indivíduo e em seu potencial durante o processo de integração é significativamente associado com menor rotatividade de colaboradores e a maior satisfação do cliente.

Executivos que desejam saber se a sua organização ajuda as pessoas a identificar e alavancar seus pontos fortes podem se perguntar o seguinte: "Conheço os talentos e as paixões de meus funcionários? Converso com eles sobre o que dominam e o que podem melhorar? Nossas metas e objetivos consideram maximizar o potencial dos empregados?" Se uma pessoa não enxerga um problema, não se espera que ela fale sobre isso. A maioria dos funcionários relata em questionários anônimos que se sente protegida no trabalho. Há equipes que utilizam uma abordagem multifacetada para que os funcionários se sintam à vontade para falar sobre potenciais riscos na empresa. Durante as reuniões com funcionários de toda a organização, os membros devem procurar aumentar a conscientização sobre problemas específicos com a ajuda de perguntas como: "Você sabe quantas pessoas se feriram no ano passado e onde essas lesões ocorreram?". As empresas também já começam a publicar dados de resultados de segurança nos relatórios anuais de responsabilidade social.

Portanto, deve-se mudar a forma como os gestores fazem reuniões sobre o tema. Em vez de lerem regras ou as últimas políticas de segurança, orienta-se a fazer perguntas ou propor um problema, oferecendo tempo para que os funcionários encontrem soluções. As reuniões vão se transformando em algo menos relacionado com a aprendizagem passiva e mais com a melhoria ativa de processos.

6) Viés de Especialistas

A partir do início do século 20, o movimento de gestão científica começou a introduzir uma abordagem rigorosa para examinar como as organizações operam. No processo, porém, solidificou a noção de que os especialistas são a melhor fonte de ideias quando se trata de fazer progressos. Hoje, muitas empresas continuam a recorrer a consultores, engenheiros industriais, equipes Seis Sigma e similares quando é necessário fazer melhorias. Neste artigo apontamos duas dificuldades criadas pelo viés de especialistas.

  1. Visão excessivamente estreita sobre a expertise

Muitas empresas definem o termo "especialista" de maneira muito restritiva, como base em indicadores como títulos, diplomas e anos de experiência. No entanto, o know-how é uma construção multidimensional. Diferentes percursos, como o tempo gasto na linha de frente, com clientes ou trabalhando com pessoas específicas, contribuem para a compreensão detalhada de problemas e a criação de soluções.

O viés de especialistas também pode nos levar a interpretar mal os potenciais inconvenientes associados com maior tempo e prática no trabalho. Embora a experiência aprimore a eficiência e eficácia, também pode nos tomar mais resistentes a mudanças e mais propensos a rejeitar informações que entram em conflito com nossos pontos de vista;

  1. Envolvimento inadequado da linha de frente

Os funcionários, diretamente ligados com a criação, a entrega, as ofertas e a interação com os clientes, ocupam uma posição privilegiada para identificar e resolver problemas. No entanto, é comum, mais do que gostaríamos de encontrar pessoas não habilitadas nessa função. Mesmo em organizações que defendem o "pensamento enxuto", um processo de melhoria que se destina a envolver todos os colaboradores, as práticas de trabalho padrão raramente mudam, privilegiando recomendações de especialistas.

7) A Expertise que Atrapalha

Para examinar como a experiência pode aumentar a resistência a mudanças, decidimos exemplificar de que maneira cardiologistas e investidores com diferentes níveis de bagagem profissional respondem a notícias desagradáveis que exigiam algum tipo de julgamento.

Imaginemos um procedimento cardiológico padrão de colocar uma prótese coronariana em artérias contraídas para manter o fluxo de sangue adequado. No início do ano 2000, um novo tipo de prótese, com revestimento próprio, foi lançado no mercado. Porque as taxas de reembolso eram similares entre os dispositivos novos e tradicionais, os médicos poderiam considerar os méritos científicos na hora de decidir qual usar.

Em reação a evidências de que as próteses com revestimento poderiam ser perigosas em determinadas situações, uma junta médica recomenda, no final de 2006, a não utilizá-los fora da prescrição do fabricante. Nossa análise empírica dos dados, colhidos antes e depois da divulgação desta recomendação, revelou que os cardiologistas mais experientes seguiram menos do que os médicos mais novos a recomendação de descontinuar o uso daquela prótese.

Considerando que os dados não eram claros em relação aos efeitos positivos para o paciente do uso da prótese revestida, foram realizados estudos com a área de compras, que também recebeu informações negativas sobre o produto. Observamos, portanto, os mesmos resultados. Aqueles com significativa experiência seguiram menos a orientação recebida em comparação com os menos maduros profissionalmente. A mensagem é: se não ficar atento, seu know-how pode dificultar a sua aprendizagem.

8) Incentivando os Funcionários a Reconhecer os Problemas que os Afetam

Certifique-se de que a organização incorpora o princípio de corrigir contratempos quando e onde aparecerem. Isso evita a dependência excessiva de especialistas, além de ajudar a não cometer os mesmos erros novamente. Enfrentar o problema imediatamente, quando aspectos relevantes ainda estão frescos, aumenta as chances de resolver a situação com êxito.

Espera-se que os funcionários não só cumpram metas específicas para si, mas também procurem formas de melhorar o trabalho e o desempenho geral da operação. Quando algo dá errado em seu horário de trabalho, o funcionário é responsável por corrigir o problema. Isso pode envolver recrutar outros para ajudar ou até mesmo sair para comprar novos equipamentos, embora estejam cientes dos limites em relação ao que podem fazer sem autorização. As empresas devem incentivar o comportamento de resolução de problemas, não só por meio da sua cultura, mas também com a ajuda de práticas de remuneração. O pagamento é baseado tanto no cumprimento de metas como na melhoria ao longo do tempo. Por exemplo, consideremos dois grupos de funcionários. Aqueles que executam a mesma tarefa repetidamente, "experiência especializada", e aqueles funcionários que alternam diferentes funções, "experiência variada". Constata-se que, durante um único dia, o primeiro grupo é mais rápido. Ao longo do tempo, porém, no segundo grupo, revezar o tipo de trabalho favorece a aprendizagem e ajuda a manter os colaboradores mais comprometidos.

Ambos os tipos de experiência, especializada e prática, são importantes para a aquisição de conhecimento. Permitir que os funcionários tenham outros tipos de experiência e se aprofundem em cada uma delas é algo valioso. Outro fator que contribui para a melhoria do trabalho executado é a familiaridade entre os membros da equipe. Em diversos tipos de estudos, como em empresas de desenvolvimento de software, de consultoria, organizações de saúde e laboratórios, pode-se constatar que trabalhar com as mesmas pessoas ajuda a reforçar a coordenação, aperfeiçoar a utilização de conhecimentos valiosos que existem no grupo, acelerar a resposta a novas circunstâncias e melhorar a forma como as pessoas combinam seus conhecimentos para resolver problemas de maneira eficaz.

As empresas devem buscar firmemente identificar e remover as barreiras que impedem as pessoas de utilizar seus conhecimentos. Resolver problemas de clientes de maneira inovadora e que crie valor, sem navegar por impedimentos organizacionais, deve ser a parte difícil do trabalho. Os funcionários trabalham de maneira menos produtiva quando os gestores os observavam. A empresa diz dar liberdade ao funcionário, mas suas práticas sugerem o contrário. Por exemplo, muitos colaboradores deixam de compartilhar ideias para melhorar os processos. Os gestores devem identificar maneiras que podem de fato capacitar os funcionários, seja ao permitir maior liberdade, reconhecer publicamente suas contribuições ou oferecer recompensas monetárias.

No curto prazo pode-se ignorar falhas, agendar o trabalho de modo que não sobre tempo para a reflexão, exigir o cumprimento de normas organizacionais e procurar especialistas para ter soluções rápidas. Mas essas abordagens tendem a limitar a capacidade da organização de aprender. Líderes que encontram meios para combater os vieses descritos neste artigo têm maiores chances de favorecer o poder da aprendizagem durante suas operações, uma maneira de verdadeiramente se aprimorar continuamente.

Conclusão

Neste artigo observa-se que o aprendizado que ocorre dentro das empresas se divide em alguns viesses, onde as organizações aprendem em empresas onde as pessoas expandem continuamente sua capacidade de criar os resultados desejados, através de novos padrões de raciocínio e com o auxílio de pessoas que aprendem continuamente a aprender em grupo. Além disso, há o aprendizado organizacional, que é a aquisição de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes que visam a manutenção, o crescimento e o desenvolvimento da empresa.

A princípio, estas perspectivas parecem ter o mesmo significado, mas, realizando uma análise mais criteriosa, observa-se que estas visões têm significados distintos. Dentre as diferenças destes pontos destaca-se que o aprendizado organizacional se refere ao aprendizado individual e em grupos nas empresas. Já a organização que aprende desenvolve o aprendizado através da organização, como um

sistema integrado. Outra diferença marcante é que as organizações que aprendem tem a finalidade de mudar seus processos através do aprendizado e a teoria do aprendizado organizacional visa compreender e analisar como ocorre o aprendizado dentro das organizações.

Apesar destas diferenças não se pode afirmar que estas abordagens são distintas e que não podem coexistir. Muito pelo contrário, a organização que aprende e o aprendizado organizacional podem e devem coexistir. Para que uma empresa se torne uma organização que aprende é preciso ocorrer, primeiramente, o aprendizado organizacional. Não há como uma empresa se tornar uma learning organization sem obter, primeiramente, o aprendizado organizacional.

Referências

[1] BASTOS, A. V. B.; GONDIM, S. M. G.; LOIOLA - Aprendizagem organizacional versus organizações que aprendem: características e desafios que cercam essas duas abordagens de pesquisa. São Paulo: RAUSP Revista de Administração v. 39, n.3 – 2017

[2] GUNS, B. A Organização que aprende rápido: seja competitivo utilizando o aprendizado organizacional. São Paulo: Editora Futura – 2017

[3] SENGE, P. M. A Quinta disciplina: arte, teoria e prática da organização de aprendizagem. São Paulo: Best Seller, 2016.

SOBRE O AUTOR

Lenildo Morais

Mestre em Ciência da Computação pelo Centro de Informática da Universidade Federal de Pernambuco. Pesquisador ASSERT - Advanced System and Software Engineering RESEARCH Technologies Lab. Experiência em Engenharia de Software, atuando nos seguintes tópicos de pesquisa: Qualidade de Software, Metodologias e Processos de Desenvolvimento de Software, Engenharia de Requisitos, Testes de Software e Gerência de Projetos. Membro do Conselho Consultivo da Revista Information Management. 

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