Não há estatísticas precisas, mas o senso comum aponta número expressivo de empresas que carecem de estratégia sólida de colaboração, baseada em políticas bem definidas de divulgação, acesso e gestão do conhecimento. A má notícia para esses negócios é que eles terão de correr contra o tempo para se adaptar a uma realidade inescapável. Segundo especialistas, a interação dos funcionários por meio de ferramentas sociais, seja entre si, seja com públicos externos à companhia, já ocorre em grande velocidade e independe de as empresas terem ou não se planejado para isso. Os fornecedores de plataformas de colaboração e sistemas corporativos, como ERPs, adicionam cada vez mais ferramentas de colaboração social aos seus produtos. Além disso, a rápida popularização de tecnologias como SharePoint 2010, que se integra a redes sociais, tende a empurrar as empresas em direção à colaboração, quer estejam preparadas ou não.
[private] Para empresários empenhados em se alinhar a essa tendência, os desafios não são pequenos. É preciso encontrar uma equação que equilibre fatores diversos, como legado tecnológico, verba para investimento e políticas de segurança e de acesso. Isso tudo considerando as especificidades do negócio, sua cultura e seu interesse em criar um ambiente de inovação nas suas dependências. Na prática, significa solucionar questões como: O que é informação de missão crítica, e qual o tratamento que recebem em um contexto de colaboração? O que é possível ser de acesso geral? O que é restrito a cada área ou cada cargo? Como é feita a gestão do conhecimento em ambiente de colaboração? Entre muitas outras.
Código de conduta
Mário Costa, gerente de soluções de colaboração da IBM Brasil, diz que o planejamento e elaboração de políticas de colaboração envolvendo públicos internos e externos normalmente começam com a definição de quem será responsável pela criação de uma norma ou código de conduta que irá nortear as relações colaborativas. É esse time ou área que avaliará, por exemplo, como diferentes formas de colaboração podem ser integradas às iniciativas existentes e aos projetos da empresa. “Essa equipe deve buscar oportunidades de colaboração com clientes e parceiros ao longo de toda a rede de valor, e não só dentro de casa”, diz Costa.
O importante, na visão do gerente, é que as diferentes formas de colaboração sejam integradas ao contexto dos processos de negócio e à rotina de cada funcionário. É isso que irá garantir ganhos de produtividade, e não a ferramenta em si. “Se o projeto tem como descrição meramente implementar um wiki ou um blog ou aumentar as cotas de email, provavelmente haverá potencial não explorado”, diz Costa. Ele alerta para o risco das “ilhas” (projetos isolados ou ferramentas sem um real contexto de colaboração social) “Trata-se de modelo perigoso, porque contribui para a criação de silos de conhecimento e porque dificulta o controle e auditoria ao longo dos processos”, alerta.
Lembrando que ferramentas de colaboração corporativas já possuem mecanismos que permitem lidar de forma eficiente com a confidencialidade de informações, distinguindo o que é de acesso geral e o que é restrito a cada área, Costa diz que a empresa pode escolher entre um padrão de restrição (restringe-se tudo, menos o que está autorizado a ser compartilhado) ou um padrão de abertura (abre-se tudo, dando ao próprio usuário a opção de restringir o acesso quando julgar necessário). Ele observa que há uma tendência para o adoção do padrão de abertura, desde que as companhias contem com ferramentas apropriadas. Isso porque o maior valor da colaboração está justamente em fomentar e facilitar a troca de informações, ele ressalta.
O executivo da IBM destaca o impacto das redes sociais na gestão de conhecimento, na medida em que fomentam a sua captura e compartilhamento. “Com o fortalecimento das redes sociais, o conhecimento passa a ser mais facilmente consumido (localizado e acessado) e compreendido, por meio da interação com especialistas”, diz Costa, para quem as plataformas de software social corporativo devem prover mecanismos de recomendação de pessoas e de conhecimento (arquivos, links, páginas, blogs, wikis, comunidades etc.). Ao usuário deve ser possibilitado não apenas encontrar o que procura, mas também identificar com facilidade conhecimentos de seu interesse mesmo nos momentos em que não os procura.
Totalmente focadas no negócio e nas pessoas que o conduzem e executam (diferentemente das ferramentas públicas, como facebook e twitter), as redes sociais podem otimizar processos nos mais diferentes níveis. “Níveis de estoque, por exemplo, podem ser informações de missão crítica para determinados negócios, e a colaboração pode ajudar a engajar e otimizar os processos que lidam com estoque”, exemplifica Costa. Ele informa que a IBM ajuda os executivos de empresas selecionadas a identificar áreas onde há maior potencial para a colaboração, por meio de um processo denominado “Agenda de Colaboração”.
Social business
O principal consultor da Atos Origin, William Rice, defende que, para implementar um ambiente de trabalho colaborativo, a empresa precisa atentar para as necessidades explicitas e implícitas dos funcionários. Ele não questiona o potencial que as ferramentas colaborativas têm para facilitar processos de negócios formais e estruturados. “Mas a “cola” (conexão e relações) entre as pessoas é igualmente importante, diz o consultor da fornecedora que acaba de lançar solução Social Business, que abrange desde serviços de infraestrutura para a captura, acesso, armazenamento e recuperação de informação até aplicativos de colaboração para estruturar conteúdos, além de solução para identificar conexões entre pessoas, conhecimento e processos.
Na visão de Rice, as empresas devem, observados limites, permitir que as pessoas descubram por si mesmas o uso de ferramentas sociais, escutá-las e aprender com elas. As companhias que já conseguiram, por meio da colaboração, mudar mecanismos internos de trabalho e acumular maturidade, devem expandir a experiência para incluir parceiros e clientes, tornando-se assim um “social business”. “Nas ‘Smart Organisation’, como chamamos, a gestão do conhecimento se tornará mais social e, portanto, mais relevante e mais ‘real time”, estima o especialista.
É certo que, para chegar a esse ponto, os desafios das companhias são muitos. Rice destaca o esforço de integrar ferramentas sociais à atual infraestrutura, a árdua tarefa de engajar profissionais e mudar culturas internas e o desafio de não abrir brechas na segurança da informação, além do imbróglio relativo a questões de privacidade. “A Atos Origin acredita que o individuo deve ter a liberdade de escolha para ativar ou não alguns serviços e recomenda um debate público sobre o assunto”, diz Rice. Ele informa que a Atos Origin incentiva seus funcionários a usar ferramentas como o Office Communicator e tem desenvolvido plataformas de comunidades sociais virtuais para compartilhar e manter o histórico dos conhecimentos gerados. “Os feedbacks iniciais que temos recebidos relatam que a adoção dessas ferramentas reduziu uso de e-mails em 10% a 20%, imediatamente”, informa.
Controle da confidencialidade
Denis Abrantes, consultor sênior de vendas da Oracle do Brasil, revela como a multinacional, importante player na área de colaboração, enfrenta internamente o desafio de organizar intranets, wikis e comunidades. “A nossa intranet conta com a solução Oracle Web Content Management, que oferece fóruns de discussão e comunidades internas, baseados na mesma tecnologia de portal e colaboração que oferecemos aos clientes”, diz Abrantes. Além disso – ele diz, a fornecedora possui outros recursos, como microblogs desenvolvidos apenas para uso interno. “Os colaboradores da Oracle são estimulados a participar de fóruns e os usuários mais ativos são reconhecidos com o título de ‘Oracle Ace’”, diz o consultor.
No que se refere à política de acesso e segurança da informação, Abrantes diz que a Oracle disponibiliza guias, para uso de funcionários e prestadores de serviços, com todas as regras sobre conduta e divulgação de informações via blogs e links. A empresa usa ferramenta de Digital Rights Management, que permite conceder ou retirar o acesso de usuários locais ou remotos a determinado documento e garante controle de acesso e rastreamento de documentos de missão crítica e com informações restritas mesmo fora da rede corporativa. “As políticas de segurança associadas aos documentos garantem que informações confidenciais não poderão ser publicadas nos sites abertos, porém estarão disponíveis para usuários na intranet”, diz.
O especialista alerta para a falta da categorização dos documentos em ambiente de colaboração, equívoco que observa em muitas empresas. Segundo ele, normalmente os usuários utilizam o recurso “copiar e colar” para armazenar documentos no repositório, o que impede sua categorização correta e limita sua localização à busca textual completa. Já entre as melhores práticas, ele cita clientes que conseguem programar autênticas campanhas internas no roll out do projeto. “Trata-se de ótima iniciativa, pois gera interesse dos funcionários em conhecer e utilizar a nova ferramenta”, avalia.
No que se refere às políticas e acesso, Abrantes considera ideal que a área de segurança da informação seja responsável pelo mapeamento dos níveis de segurança, os quais são implementados em um repositório de conteúdo e se tornam transparentes para os usuários. “Trabalhamos com um cliente em que usuários da área de engenharia não tinham permissão de acessar documentos de precificação do projeto, mas colaboravam com o preenchimento da documentação técnica do mesmo”, exemplifica.
O consultor da Oracle avalia a modelagem dos níveis de segurança como etapa crucial na definição do repositório de conteúdo. “Normalmente, o primeiro nível de segurança depois de ‘público’ é o ‘interno público’, em que todos os funcionários teriam permissão, porém ninguém fora da empresa poderia ter acesso. Depois disso, os níveis de permissão são definidos por área e por nível de confidencialidade da informação”, explica.
Para Abrantes, é importante que as empresas saibam que não precisam escolher entre proteger a informação ou estimular a colaboração. “Ambos são possíveis, dado um planejamento adequado do repositório e dos recursos de proteção ao capital intelectual que estarão disponíveis. As soluções Oracle estão prontas para apoiar requisitos complexos de segurança” afirma.
Inovação aberta
Por sua vez, Sérgio Cochela, CEO da Nous Software – empresa que investiu R$ 1,5 milhão no desenvolvimento de plataforma social focada na inovação e no incremento da produtividade por meio da colaboração, e que já conquistou clientes de porte como a fabricante de calçados Grendene – observa maior conscientização do empresariado brasileiro quanto ao uso bem planejado de ferramentas sociais. “Muitos ainda associam redes sociais a improdutividade e se chocam com a ideia de a alta administração discutir e colaborar no mesmo nível com todos os funcionários. Mas cresce o número dos que já assimilam a tendência”, diz o executivo.
A sugestão do especialista para empresas que querem organizar o seu ambiente colaborativo é começar por uma revisão da política de segurança. “É preciso confiar nas pessoas, trazê-las para comunidades para discutir os assuntos importantes dos negócios e assim evoluir em processo, em melhoria continua e em inovação”, diz o CEO.
O executivo destaca que está em pauta atualmente a inovação aberta, conceito em que a empresa abre a sua rede para o públicos externos, recebendo a contribuição de acadêmicos, parceiros e até clientes em seus processos de inovação. “A contribuição desses agentes externos se dá dentro da rede de colaboração e, tão logo termine o projeto ou processo, o seu acesso pode ser retirado. Mas todo o conhecimento gerado fica disponível para a organização”, explica Cochela.
Para o CEO, o conhecimento que se constrói de forma colaborativa é muito mais robusto e representativo e, se compartilhado com as pessoas na empresa, gera um ambiente em que as melhorias e a inovação aconteçam de forma natural. “Todas as empresas têm um estoque de conhecimento que não domina, ou seja, elas não sabem exatamente quem sabe o quê. As plataformas sociais colaborativas as ajudam a capturar, reter e compartilhar esse conhecimento”, diz.
Cochela é adepto da introdução gradativa de projetos de colaboração nas companhias, começando com um ou dois menores e, obedecendo à política de segurança da empresa expandindo-os na medida em que a ideia permeia toda a organização. “Não dá para implementar uma solução em um dia e esperar que no dia seguinte toda empresa esteja colaborando”, diz o executivo, citando cliente onde a plataforma começou focada na área de P&D, para acesso de apenas 90 pessoas. “Só eles enxergam o conteúdo porque definiram se tratar de missão crítica e, portanto, nem mesmo a área de TI tem acesso”, diz.
Apesar do crescente reconhecimento dos empresários de que é necessário abrir um pouco mais a organização para a colaboração, o receio da perda de controle sobre as informações estratégicas ainda funciona como freio para os investimentos. “Essa é uma questão que as empresas têm de resolver, porque ninguém pode colaborar com os objetivos estratégicos do negócio se não tiver acesso a pelo menos alguns deles. Como colaborar com algo que não se sabe o que é?”, finaliza.
Dicas de analistas
Entenda o valor que ferramentas de colaboração social adicionam à colaboração tradicional, a fim de criar ou atualizar a estratégia de colaboração da organização.
- Desenvolva estratégia de colaboração em torno de padrões de colaboração comuns e repetitivos dos trabalhadores, não de ferramentas, para produzir soluções que combinam a colaboração social e a tradicional.
- Atualize-se quanto aos diversos segmentos do mercado fornecedor de plataformas de colaboração.
- Incentive uma cultura de colaboração na organização para implementar efetivamente as soluções.
Fonte: Info-Tech Research Group [/private]