Por Vinicius Pessin, CEO da Eu Entrego, startup de entregas colaborativas
Uma rápida comparação entre os hábitos de compra antes da pandemia de covid-19 começar e o momento atual já é suficiente para perceber quanto o varejo e o consumidor mudaram ao longo dos últimos 12 meses. Se antes era preciso ir até a loja para escolher o produto, pagar e levá-lo para a casa, hoje a situação é bem diferente: a pessoa compra pelo site, aplicativo, WhatsApp ou até pelo telefone e recebe o pedido do estabelecimento (até no mesmo dia, em alguns casos) sem ter que sair de casa. Foi uma realidade imposta pelas medidas de restrição e isolamento social, mas que certamente vai continuar no futuro pelos benefícios e pelas vantagens que trouxe aos cidadãos. Dessa forma, as lojas físicas precisarão assumir um novo papel daqui por diante. Elas também se transformarão em centros de distribuição.
É uma quebra de paradigma importante no varejo. A ideia de integração de canais de vendas (o omnichannel tão debatido nos últimos anos) finalmente passou da teoria à prática – ainda que de forma apressada por conta do avanço do novo coronavírus. A fim de respeitar as regras impostas para prevenir o contágio, as pessoas recorreram ao ambiente digital, e as empresas não tiveram alternativa senão disponibilizar essas ferramentas a seus clientes. A prática surtiu efeito, e um levantamento da agência de marketing digital Raccoon para o projeto E-commerce Brasil mostra que nove em cada dez (89,1%) profissionais ligados ao varejo acreditam que as estratégias digitais terão mais importância no pós-pandemia.
Mas por que essa aceleração digital está mudando a percepção da própria loja física, que se posiciona como um elemento importante das entregas, principalmente entre as grandes redes do país? Dois fatores principais explicam esse cenário. O primeiro deles, evidentemente, diz respeito à própria mudança da experiência de compra. Ora, se o consumidor não vai mais à loja, é a loja que precisa ir ao encontro dele – e com mais eficiência do que seus concorrentes.
Isso se revelou um desafio para a logística nacional, que de uma hora para outra encarou aumento não só de demanda, mas de pressão por entregas mais rápidas. Em alguns casos, as compras precisam ser entregues no mesmo dia, como itens de farmácia e supermercados. Assim, levar o produto da loja mais próxima até o usuário é muito mais eficiente, barato e simples do que transportar o pedido desde o centro de distribuição.
O segundo fator decorre da presença de novos modelos logísticos no mercado brasileiro. Há pouco tempo, o varejista não tinha muitas escolhas na hora de garantir o transporte de suas mercadorias para pedidos nos canais digitais. As empresas menores ficavam reféns dos Correios, enquanto as maiores recorriam às transportadoras, que por sua vez encontravam dificuldades para realizar o último trecho das entregas. Agora, com o advento do conceito de crowdshipping (em que cidadãos comuns com seus carros transportam encomendas), foi possível dinamizar esse serviço, permitindo redução no tempo – algo essencial em um cenário pandêmico.
Para que isso dê certo, é preciso que as lojas físicas sigam o exemplo de seus consumidores e também adotem a tecnologia em seus processos – e não apenas como canais de vendas e de relacionamento. Grande parte dos principais problemas logísticos que as empresas enfrentavam no Brasil passaram a ser resolvidos com o apoio de soluções de TI integradas nos sistemas de gestão. Hoje, há plataformas de crowdshipping que conseguem combinar inteligência artificial e machine learning para entregar a melhor experiência ao lojista e ao cliente, conectando rapidamente os entregadores e avisando qual loja mais próxima tem estoque para determinado pedido. Uma verdadeira economia de tempo e dinheiro.
Os desafios que cercam o varejo brasileiro ainda são muitos, mesmo com um ano de pandemia de covid-19. A doença teima em acumular recordes de casos e óbitos em todo o país, obrigando os estabelecimentos a continuarem de portas fechadas e operando quase que exclusivamente nos canais digitais. Contudo, mesmo diante dessas incertezas, é possível visualizar que as lojas físicas não serão mais as mesmas no futuro. De local isolado de compras, elas se transformarão no hub da marca, combinando vendas, relacionamento e centro logístico ao mesmo tempo.